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Sucessão na Gestão de Empresas Familiares
Os Desafios e as Vantagens da Sucessão na Gestão de Empresas Familiares
Segundo a Associação de Empresas Familiares (AEF), as empresas familiares em Portugal representam a maioria do tecido empresarial, correspondendo a cerca de 75% do tecido empresarial do país. Na região do Tâmega e Sousa e em particular no concelho de Penafiel não é exceção.
Na edição 20 da revista #Input vamos apresentar três empresas familiares que já vão na segunda geração por motivos diferentes, desafios e novas visões sobre o negócio.
Certo é que na sua génese a empresa familiar é comum a todas, parte de um pressuposto de futuro entre gerações e não tanto da grandeza que a empresa pode alcançar. No entanto, é verdadeiro dizer que as empresas familiares não são apenas pequenas e médias empresas. De resto, em Portugal, os grandes grupos económicos começaram em empresas familiares e que hoje já passaram pela segunda e terceira geração.
A Vidriluz, Fonsecas & Frade, Lda (Vidriluz) é um caso real, em Penafiel, onde a gestão da empresa foi, desde a sua base, familiar. Fundada por José Luís Frade e a esposa Maria Natália Frade, foi ao longo do tempo agregando familiares quer na mão de obra quer na sua gestão. A atividade iniciou-se em 1977, no centro histórico de Penafiel, mas já com um conhecimento sólido do casal uma vez que anteriormente tinham o mesmo negócio em Angola. Com a repatriação, o negócio foi recomeçado em Penafiel, com mais dois sócios, irmãos da sócia maioritária. Mais tarde, juntam-se de forma natural os filhos do casal e saem os sócios iniciais. Não que os filhos entrassem com quotas na empresa, mas já com os olhos postos no futuro.
Atualmente, José Manuel Frade, Celso Frade e Guida Frade partilham a gestão da empresa familiar com a mãe, Maria Natália, que por infortúnio perdeu o seu sócio maioritário em 2020.
Uma sucessão natural ao longo dos tempos, mas forçada “legalmente pela perda do nosso Pai. Até à morte dele nenhum de nós estava na gestão da empresa, embora desde muito cedo estivéssemos na gestão do negócio no dia a dia”, assumiu Celso Frade, um dos rostos desta empresa que foi crescendo ao longo dos tempos, tornando-se numa das maiores do setor do concelho de Penafiel.
Se de um modo geral, na gestão de empresas familiares o desafio da inovação embate na primeira geração, na Vidriluz a gestão dos sócios maioritários com a visão da segunda geração, nunca deixou que a inovação dificultasse o crescimento.
“O meu Pai tinha uma visão do negócio sempre em ascendente, com passos sólidos, e por isso usava-se de nós para evoluir com conhecimento e estrutura. Nunca fomos muitos colaboradores, porque também somos parte da produção, e esse ambiente facilitou a gestão entre todos. Os nossos funcionários sempre nos respeitaram, mas sempre estivemos todos ao mesmo nível na produção. A diferença é que nós, os irmãos, agora tomamos as decisões que antes eram, maioritariamente, tomadas pelo Pai”, adiantou Guida Frade, a última dos filhos a entrar na empresa. “Eu trabalhei numa outra empresa e quando cá cheguei percebi que eramos todos iguais, só que a nós dependiam decisões mais difíceis. De resto, não fazemos distinções e parece-nos ser a chave do nosso sucesso”. José Manuel Frade, o primeiro dos filhos a entrar na empresa, por ser o filho mais velho e o primeiro a iniciar a atividade laboral, afirma que “aqui todos fazemos de tudo, embora tenhamos as funções bem definidas, acabamos todos a ajudar, nomeadamente, colocando os colaboradores em todos os processos. A responsabilização faz o grupo mais coeso e forte”.
A sucessão foi feita ao longo dos tempos, no entanto, no que toca a quotas na empresa “foi com a morte inesperada do Pai que teve de acontecer, lembrando que a sócia maioritária se mantém diariamente na empresa. A nossa mãe está cá para que saibamos que a união familiar é que vai dar continuidade ao negócio por muitos anos”, afirma Celso Frade. Maria Natália ouve atentamente as palavras dos filhos a descrever o funcionamento da empresa e afirma que “no negócio passamos por muitas dificuldades, mas o que sempre me preocupou foi o futuro deles sem nós. Se a união entre eles se manterá. Mas sinto que agora isso já não é problema. Eles sabem que o negócio depende deles e durante alguns anos sei que vão continuar a lutar pela empresa que tanto nos custou ao longo da vida”.
Para os colaboradores a entrada dos filhos na empresa foi aceite de forma natural, como foram envolvidos no processo, nunca sentiram uma diferença entre o Pai e os filhos, e “claramente perceberam que também eramos gestores e essa passagem de administração foi tão natural como a nossa convivência diária”.
Sobre os clientes “também não houve essa dificuldade porque o nosso pai, a partir de certa altura, colocou-nos na gestão da empresa e todos se habituaram a nós, sem que fosse necessária uma passagem legal para que houvesse esse reconhecimento”, explicou Celso Frade.
E se na Vidriluz a sucessão na gestão familiar foi feita ao longo do tempo, na Albano Magalhães, Lda foi literalmente de um dia para o outro. O infortúnio bateu à porta e a gestão da empresa foi adaptada à realidade.
A empresa Albano Magalhães, Lda, materiais de construção e distribuição de gás, completa neste ano de 2025, 50 anos de atividade, estando na gestão do fundador e da esposa Fátima Magalhães até 1996, aquando da morte do administrador. Nesse momento, não só a dor familiar falou mais alto, como a necessidade de dar continuidade de um negócio que corria da melhor forma. Quatro espaços abertos ao público entre Penafiel e Marco de Canaveses, dois armazéns e uma sócia com duas filhas, de 7 e 18 anos. É a mais velha, Susana Magalhães que não perde tempo e abraça o negócio junto com a mãe até hoje.
“A sucessão na gestão não existiu, não houve preparação de modo algum, e a minha mãe era a única que estava por dentro do negócio. Eu, apesar de crescer nos corredores da empresa, ainda estudava e não estava nos planos parar de estudar e juntar-me. A vida não me deu outra alternativa e achei que tinha de o fazer e passaram já quase 30 anos a liderar o negócio com a minha mãe”, começou por explicar Susana Magalhães.
A empresa passou por várias transformações, como é apanágio em todos os setores, e Susana Magalhães foi tomando decisões e direcionando o negócio para a área da distribuição de gás, o que fez com que tivesse de fechar 3 espaços e dispensar muitos colaboradores ao longo do tempo.
“Logo no início, duas mulheres a liderar mais de 20 homens foi difícil. Havia respeito pela minha mãe, mas eu não passava da filha, jovem e aos olhos deles sem autoridade. Precisei de chamar a minha mãe para dar indicações para que fossem acatadas. Naturalmente com o tempo ganhamos o respeito de todos e hoje ninguém tem dúvidas de quem lidera. Inclusive clientes e fornecedores, que no início mostraram alguma resistência, uma vez que estavam apenas habituados ao meu pai, mas hoje estão connosco e com a melhor relação”.
É aqui que se encontra uma das maiores dificuldades na sucessão, a preparação para o exterior, que neste caso não foi possível ser feita e, por isso, uma dificuldade acrescida para estas duas mulheres gestoras.
Com um negócio de 50 anos é inevitável pensar constantemente no futuro, mas para Susana Magalhães há uma certeza “a minha filha não dará continuidade nem eu quero. O futuro será vender o negócio ou mesmo fechar. O ciclo familiar irá terminar”.
Uma decisão difícil de tomar, mas que tem vindo a ser pensada e trabalhada para o bem pessoal e familiar.
E se é certo a durabilidade na gestão de empresas familiares, devido às sucessões na gestão, certo é também que numa sucessão bem estruturada o negócio pode até ganhar outra proporção.
É o caso da TEB – Materiais de Construção, Lda (TEB), em que desde o início da sua atividade, o fundador tinha em mente o futuro da empresa, e, por isso, levou consigo para o negócio o filho, Luís Teixeira. Apesar de José Teixeira já ter outros negócios, é com a TEB que o futuro começa a ser delineado. “O meu pai tinha uma certeza, aos 60 anos queria estar reformado e, nesse sentido, foi sempre preparando a sua saída”, começa por explicar Luís Teixeira, atual líder da empresa.
Foi com 19 anos que o pai o convidou para este negócio, numa altura em que Luís Teixeira deixava o ciclismo profissional, a base que o próprio assume para a sua liderança. “Foi no ciclismo que aprendi muito do que aplico hoje na empresa, os valores, o trabalho em equipa, a gratidão para com os meus colegas e por todos os clientes que são quem nos mantém de pé”.
De 2003 a 2009, o negócio seguia uma metodologia mais tradicional, o fundador José Teixeira assim o ditava, e Luís Teixeira foi passando por todas as áreas da empresa, sabendo que era no conhecimento de campo que ia beber do conhecimento que depois iria aplicar mediante a sua forma de liderança.
“A minha liderança é muito diferente da aplicada pelo meu pai, não sei se melhor, mas diferente. Ele sempre foi mais conservador e, por isso, as nossas ideias entravam algumas vezes em conflito. Assim, quando o meu pai decidiu aposentar-se, eu pude fazer as mudanças que refletem o crescimento da empresa ao dia de hoje”. E a diferença é visível não só no volume de negócios, na liderança do mercado na região norte, como também no número de colaboradores.
“De 4 passámos a 40 colaboradores e isso é fruto do crescimento, da minha ambição em crescer e adaptar o negócio à realidade. Eu estou sempre a pensar no futuro, em como posso manter a empresa e a vida destas pessoas que me acompanham diariamente. Eu lidero uma equipa que são, acima de tudo, pessoas, famílias que dependem de mim e, por isso, tenho de ser eu a pensar no futuro, com ou sem Luís Teixeira”, assume, dizendo que a sua dedicação ao negócio é total porque tem o apoio da sua família.
“Sem a minha família nuclear eu não podia ter dedicado tanto tempo a este negócio. E é tão verdade que eu percebi isso há muito pouco tempo. Levei a minha filha à escola pela primeira vez quando ela tinha 12 anos. Nunca me cobraram essa ausência, mas a alegria que tive naquele dia, fez-me perceber que abdiquei de muito para o crescimento desta empresa”.
A elas (filha e esposa) agradece a compreensão e dedicação a ele próprio, que lhe permitiu viver o seu negócio de corpo e alma.
Mas se houve alguma resistência à mudança por parte do fundador, na era Luís Teixeira a mudança é uma constante. No entanto, percebeu como a mudança pode ser exposta e bem recebida por todos. Sejam colaboradores ou clientes. Clientes esses, muitos deles, que acompanham o Luís desde o tempo do pai.
“Todos os clientes do meu pai ficaram comigo e estão cá hoje. Tenho a certeza de que o meu pai tem orgulho nesse processo e no que hoje aqui temos. Apesar das diferenças, também é por ele que o negócio ainda existe. A base foi dele e respeito muito o seu legado”.
A preparação na sucessão da gestão das empresas familiares é importante, mas nem sempre possível. No entanto, há um elo comum a todas: os valores familiares acima dos números do negócio. A base de uma gestão assente nas pessoas muda e transforma qualquer negócio, e a liderança de Luís Teixeira é prova disso. “A minha liderança vive na expressão que uso: «Roda Positiva». Se todos acrescentarmos algo de bom no negócio, nas relações empresariais e comerciais, o futuro é mais seguro, porque está assente nas pessoas. E sem pessoas não há negócios, nem futuro”.